“The Stonewall Celebration Concert”
Ouvi “Stonewall” pela primeira vez em 1997, pouco após a morte de Renato Russo. Entre 1997 e 2000 ocorreu um movimento saudosista entre os fãs da Legião urbana alimentado por discos póstumos, o lançamento do acústico MTV da Legião e o retorno “triunfante” do Capital Inicial. No meio de tudo isso o Stonewall e o disco de canções italianas “Equilíbrio Distante” me pareciam produtos complexos demais para os jovens do final dos anos 90. Era um disco auto afirmativo, cheio de canções obscuras de artistas que não eram conhecidos no Brasil, um verdadeiro quebra-cabeça sobre quem era Renato Russo – um artista que estava muito a frente de grande parte de sua audiência roqueira e eu era um deles. Toda vez que colocava o CD para tocar me ocorria uma questão: que canções são essas? A pergunta só pode ser respondida daqui do futuro com a chegada da internet, do MP3, do streaming e a possibilidade de encontrarmos as canções originais com dois ou três cliques.
Recentemente “Stonewall” foi relançado em vinil duplo, comprei e ouvi o álbum pela primeira vez em mais de 20 anos. Foi revelador, tive a sensação de estar olhando para um farol, um guia rodoviário que me trouxe até aqui mesmo que eu nunca tenha dado o devido credito à ele.
Me parece hoje que, sem eu perceber, as escolhas musicais de Renato Russo me influenciaram à navegar para muito além do rock e pesquisar a poesia do folk e do country dos anos 60 e 70. Me apaixonei por Dylan, Nick Drake (músico de nenhum sucesso que veio a ser redescoberto pela geração do Renato Russo), Emmylou Harris (e Neil Young e Joni Mitchel no unplugged), mas não apenas por eles. Estes eram apenas o topo de uma montanha de cantores e compositores que entregaram o melhor de si em discos autorais que foram completamente perdidos no curso da historia da música pop. É com esses artistas menores que me identifico e me sinto próximo na maior parte do tempo, escrevendo para o vento, para o futuro, para acalmar as coisas em mim mesmo.
Hoje é possível visitar o passado e encontrar informações que preenchem as lacunas em reflexões que tivemos por anos como, por exemplo, as origens de Stonewall. Por baixo de um álbum feito basicamente de violão e piano existiam varias camadas, um discurso existencialista sobre o amor, muito além do assunto do homossexualismo que o titulo do álbum sugere e que deixava a mensagem principal em segundo plano. Em entrevista para a Folha de São Paulo, Renato menciona que o Stonewall surgiu como um contraponto ao ressurgimento do Fascismo no Brasil. Ele já via as coisas que presenciaríamos nos últimos anos neste país e fez um disco sobre amor que resiste ao ódio. “Eu fiz esse disco para mostrar que a gente tem dignidade, que tem pessoas legais trabalhando pelas diferenças. O fascismo é muito perigoso, daqui a pouco se você não for macho, adulto e branco, você está perdido."
Você pode ler a entrevista realizada em junho de 1994 neste link aqui.